I
Em geral, a meditação não é um hábito muito enraizado no homem.
De tempos a tempos, quando enfrenta dificuldades, problemas para resolver, quando sofre, ele torna-se pensativo e reflecte porque tem necessidade de encontrar uma solução.
Mas ainda não se pode chamar a isso meditar; é apenas uma reacção instintiva, natural, face ao perigo ou à infelicidade.
Sim, nesses momentos, o homem, que necessita de refúgio, recolhe-se instintivamente em si mesmo e começa até a orar, a virar-se para um Ser que tinha negligenciado porque até aí tudo lhe corria bem.
Agora, ele volta-se de novo para esse Ser, procura-O, porque se recorda de que, quando era criança, os pais lhe haviam dito que Ele omnipotente, omnisciente e todo amor; então, ele dirige-se a esse Ser para pedir ajuda e socorro com a maior humildade, com um sentimento de uma intensidade extraordinária.
Sim, mas para isso é preciso que surjam casos excepcionais: um perigo, uma guerra, uma doença, uma morte.
No seu dia a dia, as pessoas, quando estão tranquilas e felizes, não têm a mínima vontade de orar ou de meditar, não consideram, de modo nenhum, este exercício como uma necessidade indispensável, não vêem mesmo onde está a sua utilidade.
Quando tudo corre bem, acham que não têm nada a fazer nas regiões vagas e nebulosas da meditação.
Mas na infelicidade, nas grandes dificuldades, quando se apercebem de que nada do que é concreto e material pode ajudá-las, então, procuram interiormente um apoio, um socorro, um abrigo nas regiões celestes.
Está bem, contudo elas encontrariam mais facilmente esse apoio se não tivessem esperado por ocasiões excepcionais para recorrer ao Céu, se tivessem feito da meditação uma prática quotidiana.
Sem a meditação não é possível uma pessoa conhecer-se nem tornar-se senhora de si mesma, nem desenvolver qualidades e virtudes.
E é precisamente porque não deram um lugar preponderante à meditação que os humanos continuam fracos na sua vida interior, nos seus sentimentos e desejos.
É claro que não há que ter ilusões!
É muito difícil meditar.
Enquanto se estiver empenhado em ocupações prosaicas ou mergulhado em paixões, não se pode meditar.
É preciso procurar libertar-se interiormente para se poder projectar o pensamento até ao Eterno.
Eu vi pessoas meditarem durante anos que perdiam o seu tempo ou até ficaram perturbadas, porque não sabiam, ou não queriam saber, que para meditar é preciso respeitar certas condições.
Enquanto não se é livre interiormente, não se pode meditar.
Mas quantas pessoas não há que se envolvem em negociatas, chafurdam, bebem ou vão para a cama com quem calha e depois... "meditam"!
Não, isso não é possível, porque a natureza dessas actividades não o permite: elas retêm o pensamento nas regiões inferiores.
Eu sei que a meditação está cada vez mais na moda, mas isso de modo algum me alegra, porque vejo uma quantidade de desgraçados que estão a embarcar num domínio que não conhecem.
Como quereis meditar se não tiverdes um alto ideal que vos liberte dos vossos caprichos, das vossas depravações, dos vossos prazeres, dos vossos desejos, para vos conduzir até ao Céu?
Não conseguireis meditar sem terdes vencido certas fraquezas, sem terdes compreendido certas verdades, e não só não o conseguireis, como até é perigoso tentardes.
Algumas pessoas fecham os olhos ou põem-se em pose, mas, interiormente, o que é que se passa?
Onde é que elas estão?
Só Deus sabe.
Se pudésseis entrar nas suas cabeças, verificaríeis que estão a dormir, coitadas!
É isso a meditação profunda...
E hoje em dia vai-se ao ponto de fazer demonstrações públicas de meditação.
É ridículo!
Que meditação se pode fazer perante um público?
Nalguns casos, é possível, mas só para uma pessoa que seja tão avançada, tão livre, que é capaz de meditar em qualquer lugar e em qualquer momento, porque o seu espírito está ligado incessantemente ao mundo divino.
Contudo, ter este amor pelo mundo sublime subentende uma evolução excepcional, o que não é o caso daqueles que fazem essas demonstrações de meditação.
Se quiserdes ter uma ideia do modo como a maioria das pessoas medita, olhai para um gato: os gatos meditam em frente do buraco de um rato; sim, durante horas, ele medita no modo como há-de apanhá-lo.
Para a maioria, a meditação é isto: meditar num rato que está algures... um rato com duas pernas!...
A meditação não é um exercício tão simples como se imagina.
Para se meditar, é preciso ser-se muito avançado e, sobretudo, ter-se um amor formidável pelo mundo divino.
Nessa altura, sem fazerdes qualquer esforço, o vosso pensamento fica logo concentrado e, mesmo sem o quererdes, meditais: o vosso pensamento está de tal modo livre que é ele que, quase independentemente da vossa vontade, parte e vai fazer o seu trabalho.
Continua
OMRAAM MIKHAËL AÏVANHOV
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