sábado, 29 de outubro de 2016

A CADEIA VIVA DA FRATERNIDADE BRANCA UNIVERSAL (Continuação - 3)



PREFÁCIO

Agnès  Lejbowicz

Uma noite, quando tinha 7 anos, viu a sua aldeia completamente destruída pelos Gregos, e passou essa noite de devastação escondido numa ribeira com a sua mãe e outras pessoas que ele próprio tinha prevenido da chegada dos invasores e conduzido àquele local.
Perdeu o pai aos 9 anos de idade.
Algum tempo depois, a sua mãe teve que voltar a casar para poder sustentar e educar Mikhaël e o irmão Alexandre.
Do seu segundo casamento, ela teve duas filhas e um filho.
Nunca se queixava e, mesmo no meio dos seus desgostos, sabia consolar as vizinhas mais infelizes do que ela.
O Mestre falou-nos muito da sua mãe, que morreu quase centenária durante o verão de 1973.
Diz que ela era uma santa e que foi ela que lhe deu a bondade inesgotável que tantas partidas lhe tem pregado e da qual ele bem tem querido "desembaraçar-se", mas em vão.
Os seus primeiros anos de escola foram difíceis.
Após a morte do pai, a situação familiar foi durante algum tempo tão precária que a mãe não podia comprar-lhe livros.
Por isso, ele tinha mais dificuldade em aprender do que as outras crianças e muitas vezes punha-se a pensar noutras coisas.
Ia descobrindo o lado exaltante do pensamento, que faz viver imediatamente aquilo que se deseja.
Quando tinha 11 anos, em Varna, secundado por um grupo de camaradas, quis substituir, na delegação turca, a bandeira dos antigos invasores pela bandeira nacional.
Ninguém ousou repreendê-lo.
Ficaram demasiado orgulhosos com a coragem e o patriotismo daquela criança.
Desde muito jovem conheceu toda a espécie de ofícios.
Trabalhou numa forja, onde gostava de observar o fogo e o trabalho do ferreiro, que dava ao pedaço de ferro incandescente uma nova forma, mas as faúlhas caíam frequentemente sobre os seus pés nus e queimavam-no...
Foi alfaiate, mas isso durou pouco tempo porque ele adormecia sobre o trabalho, a tal ponto o gesto monótono da agulha o amolecia...
Empregado numa fábrica de rebuçados, ficou encantado quando o director lhe deu permissão para comer os rebuçados que quisesse, e não se fez rogado; mas ficou tão doente, logo nos primeiros dias, que os seus apetites infantis pelos doces, nunca realizados até então, foram imediatamente acalmados...
Colocado em situações muito diversas, ele compreendeu, pouco a pouco, os problemas dos homens e acima de tudo desejava ajudá-los, aliviá-los.
Jamais as suas privações perturbavam o seu bom humor, o seu amor pelos outros; pelo contrário, elas refinavam a sua inteligência e a sua sensibilidade, desenvolviam a sua imaginação e a sua vontade e reforçavam o seu ideal, a sua fé numa vida fraterna de compreensão, de felicidade e de paz para a qual todos os homens são feitos.
À entrada da Igreja da Santíssima Trindade, em Varna, costumava estar um mendigo, com as roupas esfarrapadas, mas tão simpático com a sua longa barba hirsuta, com o qual o nosso Mestre e um amigo gostavam de estar e falar; este personagem tinha uma filosofia muito sua, reflectia acerca de todos os problemas de ordem geral e interessava de tal maneira os dois rapazes que eles decidiram fazer qualquer coisa por ele.
Foram ter com a directora de um hospício para pessoas idosas, que era professora e, com a sua generosa eloquência de adolescentes, presuadiram-na a tomar a seu cargo esse mendigo tão simpático.
Ela aceitou.
O velhote foi conduzido ao hospício pelos dois rapazes, orgulhosos por terem conseguido aliviar uma miséria humana.
Ele foi lavado, barbeado e deram~lhe uma cama autêntica num quarto a sério...
Duas ou três semanas depois, quando os nossos dois amigos passeavam pela cidade, à entrada da igreja, exactamente no mesmo local que o mendigo outrora ocupava, viram um outro...
Aproximaram-se...
Era o mesmo!
Ele explicou-lhes com gentileza que lhe dava mais felicidade mendigar e ser livre do que ficar no hospício, alimentado, alojado e limpo!
O Mestre nunca esqueceu esta lição.
Ajudar exteriormente os homens não serve de nada: eles gostam daquilo a que estão habituados, daquilo para que o seu gosto os predispõe.
Só quando se consegue mudar interiormente um homem é que se podem mudar também, as condições exteriores da sua existência.
Aos 17 anos, em 1917, travou conhecimento com um espírito excepcional, Peter Deunov, fundador de um movimento espiritualista que dirigiu durante mais de 30 anos, até à sua morte em 1944.
O seu Ensinamento não se limitava a teorias, a especulações; ele procurava orientar a actividade humana para um ideal comunitário e universalista: a Fraternidade Branca Universal.
Excomungado pela Igreja Ortodoxa, exilado da capital búlgara, Sófia, Peter Deunov instalou-se em Varna, onde o nosso Mestre habitava com a família, e foi deste modo que este o encontrou.
O amor, a devoção, o sacrifício, a admiração e a veneração que o jovem discípulo cedo manifestou para com o seu Mestre, colocando ao serviço do ideal que ele ensinava, as forças da sua inteligência e do seu coração com a maior coragem e o maior desapego, desde logo mereceram a admiração do Mestre Peter Deunov.
Ele encorajou o seu discípulo a fazer estudos universitários e protegeu-o nas sua numerosas experiências espirituais às quais ele queria consagrar todo o seu tempo, passando mais tempo na montanha, sózinho, do que nos bancos da Universidade.
Mais atraído pela curiosidade intelectual do que pelo interesse de passar nos exames, o nosso Mestre inscreveu-se durante longo tempo na Faculdade, mudando de disciplina quando lhe parecia que tinha apreendido bem os mecanismos de pesquisa, os métodos e certos resultados num determinado ramo.
Paralelamente, ele tinha ainda que ganhar a vida, mas nunca queria possuir mais do que o estritamente necessário, a fim de preservar a sua liberdade para aquilo de que gostava, e que lhe pareceu ser desde muito cedo, o melhor ofício, o melhor trabalho: explorar as regiões interiores, das quais temos tão poucos mapas...

Continua

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