terça-feira, 10 de dezembro de 2013

Os habitantes do silêncio


Nós temos necessidade do silêncio e particularmente do silêncio da Natureza, porque é na Natureza que temos as nossas raízes.
Quando uma pessoa se encontra sozinha na floresta, na montanha, pode acontecer-lhe sentir-se transportada a um passado longínquo, à época em que os humanos viviam em comunhão com as forças e os espíritos da Natureza.
E mesmo que então se ouça, de repente, o canto de uma ave ou o ruído de uma cascata, sente-se que esses sons participam no silêncio, não o destroem, pelo contrário, acentuam-no.
Por vezes, não se está consciente do silêncio, não se lhe presta atenção.
É preciso um ruído como o estalar dum ramo, o grito duma ave ou a queda duma pedra para, de repente, se viver intensamente a sensação do silêncio.
Mesmo o estrondo surdo das vagas não destrói o profundo silêncio do mar ou do oceano.
Muitas pessoas confundem o silêncio com a solidão, por isso têm medo do silêncio: têm medo de ficar sós.
Na realidade, o silêncio é um lugar habitado.
Se não quiserdes ser pobres nem estar sós, procurai o silêncio, porque o verdadeiro silêncio é povoado por inúmeros seres.
O Criador colocou habitantes por toda a parte: nas florestas, nos lagos, nos oceanos, nas montanhas, e também debaixo da terra.
E até o fogo é habitado; o éter, as estrelas, tudo é habitado.
Infelizmente, os barulhos da vida civilizada que, pouco a pouco, acabam por invadir tudo, e a existência cada vez mais materialista e vulgar dos humanos, criaram condições contrárias à permanência entre eles das entidades do mundo invisível, que se refugiam longe dos lugares que eles ocupam.
Não é que elas não gostem dos humanos, mas como podem elas permanecer em lugares que eles não param de perturbar e de devastar com a sua falta de respeito, a sua grosseria e a sua violência?... Elas retiram-se cada vez mais para regiões que são inacessíveis aos humanos.
Eu verifiquei isso.
Nos Estados Unidos, no parque de Yosemite, vi árvores magníficas, com cerca de 4 000 anos, mas que já não estavam habitadas: os devas tinham partido, porque havia demasiados visitantes, demasiado barulho, demasiada agitação; eles tinham deixado aquela região tão bela.
Em quase todas as árvores vive uma criatura, mas neste parque essas árvores gigantescas já não estavam propriamente vivas nem eram expressivas, pois já não estavam habitadas.
Tal como os sábios que se isolam nos desertos, no cimo das montanhas ou nas grutas, para escapar ao barulho e à agitação dos humanos inconscientes, os espíritos luminosos da Natureza vão refugiar-se em lugares que os humanos ainda não puderam sujar e perturbar.
Podeis dizer: «Mas eles não conseguem suportar nada, são muito fracos!»
Pensai o que quiserdes.
Na maior parte das mitologias, a montanha é apresentada como a morada dos deuses.
Isso pode ser considerado como um símbolo, mas também é uma realidade: os altos cumes das montanhas são como antenas graças às quais a terra contacta o Céu, e é por isso que eles são habitados por entidades muito puras e muito poderosas.
Quanto mais o homem se eleva nas montanhas, mais ele encontra o silêncio, e nesse silêncio descobre a origem das coisas e une-se à Causa Primeira, entra no oceano da luz divina.
Infelizmente, nos nossos dias, com o aperfeiçoamento dos meios de transporte, vemos as pessoas irem cada vez mais à montanha; tornou-se mesmo uma moda: vão aos desportos de inverno para se distrair, para se divertir e depois contar que desceram tal encosta, escalaram tal cume... E em vez de respeitar o silêncio da montanha, de se deixar influenciar por ele para descobrir os estados de consciência superiores, comportam-se como em todos os outros lugares: levam o vinho, o presunto, os cigarros, a música cacofónica, e gritam, brincam, discutem... Como se não houvesse outros lugares onde festejar e fazer barulho!
E deste modo incomodam imenso os habitantes dessas regiões.

...
Subir é desfazermo-nos, à medida que subimos, de tudo o que nos embaraça, nos sobrecarrega até encontrarmos o silêncio, a pureza, a luz, a imensidão, e sentirmos a ordem divina introduzir-se em nós...

...
Então, doravante, aprendei a amar esse silêncio, pensai em criar por toda a parte, à vossa volta, uma atmosfera espiritual de silêncio e de harmonia, a fim de preparardes a vinda dos seres luminosos e poderosos,

de OMRAAM  MIKHAËL  AÏVANHOV

em  "A via do silêncio"
Colecção Izvor
Edições Prosveta


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