Capítulo II
O CÍRCULO
I
Já vos aconteceu, com certeza, lançardes uma pedra à água: a partir do ponto em que caiu a pedra, vêem-se ondas que se propagam em círculos concêntricos.
Por ventura vos detivestes a interpretar este fenómeno?...
Aqueles que sabem decifrar o grande Livro da Natureza vêem nestas ondas circulares, que se desenvolvem a partir de um ponto central, um processo grandioso: toda a Criação do mundo expressa geometricamente.
Uma grande ciência, uma vasta filosofia está contida nesta figura.
O círculo é o símbolo do Universo e o ponto representa o Ser Supremo que o sustenta e anima.
Reparai: o centro encontra-se a igual distância de todos os pontos da periferia e, é por isso que ele mantém o círculo em equilíbrio.
Entre o ponto central e a periferia fazem-se trocas constantes e essas trocas produzem a vida em todo o espaço do círculo.
Toda a vida está lá e vibra, palpita, digere, elimina, respira, pensa...
Tomemos a imagem da roda.
Vós direis que já vistes muitas rodas.
Sim, eu sei, mas não passam de pálidos reflexos da primeira roda que pôs o mundo em movimento, e à qual a Cabala chama Hokmah, a roda celeste.
Toda a hierarquia angélica dos Ophanim, os Querubins, lá se encontra para fazer girar a roda, e Binah segue o exemplo de Hokmah para fazer girar a roda do destino de todas as criaturas.
No jogo do Tarot, é a décima carta que representa a roda.
A décima carta do Tarot é uma roda que gira.
Aliás, se se interpretar o número 10, verifica-se que o 0 é o círculo e o 1 o ponto central.
Sim, o 1 é um ponto, pois que a projecção de uma linha vertical sobre um plano horizontal
dá um ponto.
Portanto, temos o princípio masculino, o 1, o ponto central, e o princípio feminino, o 0, o círculo.
E quando o 1 e o 0 se reúnem é a plenitude.
Sem o 1, que é o princípio masculino, ou o espírito,
a matéria, o 0 não está organizada.
Ela possui todas as riquezas, mas é o 1 que a organiza.
Portanto, o 0 nunca deve estar só, senão será uma matéria desorganizada, um caos.
Está escrito no Génesis: «E o espírito de Deus movia-se sobre as águas».
O espírito de Deus é o princípio masculino que penetrou a matéria, a "água", para
a vivificar e lhe dar forma.
A água é o 0, o círculo, e o Espírito de Deus é o 1, o centro.
Sem o Espírito que a anima, a matéria permaneceria informe - tohu va bohu, informe e vazia, como diz o Génesis; mas quando ela é aflorada, animada, trabalhada pelo espírito, todas as possibilidades que ela contém começam a manifestar-se e ela torna-se um mundo organizado, um universo habitado por sóis e constelações.
O Universo é, pois, o 0, o círculo que já foi trabalhado, animado e organizado pelo espírito, o 1.
Mas o 0 sem o 1 permanece inerte, estagnado.
Podemos compreender como esta lei se aplica também à vida interior.
A pior coisa que pode acontecer a um ser humano é separar-se do 1, do espírito, para ser apenas
um 0, porque nessa altura ele transforma-se num deserto, numa terra árida, como uma mulher que não é fertilizada.
Para vos tornardes férteis deveis ligar-vos sempre ao 1.
Evidentemente, vós sois sempre 0, exactamente como o Universo inteiro: o 0 que o espírito, o 1, não cessa de animar.
O centro está sempre limitado a um ponto, ao passo que o círculo pode ter uma
circunferência infinita.
Sim, porque a matéria absorve as coisas, engole-as, para as transformar, para as moldar.
E é o que a mulher também faz: acumula, reúne alguns materiais e dá à luz uma criança; ela reúne outros materiais e confecciona um prato...
A matéria é terrível, ela atrai e engole tudo.
Aqueles que não sabem resistir a esta atracção são tragados e depois, algures, preparam-se bons pratos com eles.
Para não se ter esta sorte é preciso permanecer ligado ao espírito.
Continua
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